Programa da UFC produz 300 refeições por dia para doação a comunidades do Grande Bom Jardim
- Segunda, 30 Agosto 2021 13:52
A questão da insegurança alimentar no Brasil, que já era preocupante, agravou-se com o aumento do desemprego no contexto da pandemia de covid-19. Numa colaboração para amenizar a fome de centenas de pessoas, o programa de extensão Gastronomia Social da Universidade Federal do Ceará, em parceria com a Escola de Gastronomia Autossustentável (EGA) do Movimento de Saúde Mental Comunitária (MSMC) do Grande Bom Jardim, cadastrada como projeto do programa, passou a produzir, em maio deste ano, 300 refeições diárias para distribuição a famílias do Grande Bom Jardim, em Fortaleza, e de outras comunidades da região metropolitana.
O programa Gastronomia Social, coordenado pela Profª Eveline Alencar, do Curso de Gastronomia da UFC, e a EGA fornecem marmitas no Grande Bom Jardim para as comunidades do Marrocos, Granja Portugal, Granja Lisboa e Santo Amaro. Além disso, recebem as refeições moradores da Aldeia Indígena Pitaguari, localizada entre os municípios de Maracanaú e Pacatuba, pessoas em situação de rua e indígenas de origem venezuelana.
Na ação, cabe ao Movimento, através da Escola de Gastronomia Autossustentável a arrecadação de fundos e alimentos, organização e distribuição das quentinhas. Alunos e professores do Curso de Gastronomia da UFC se responsabilizam pelo planejamento dos cardápios e produção das marmitas, com a participação de ex-alunos dos cursos técnicos que eram promovidos pela EGA antes da pandemia e outros voluntários.
Tem sido a alternativa de alimentação de muitas crianças e suas famílias. Para alunos do Grande Bom Jardim, as escolas da rede pública e os projetos do MSMC, além de locais de formação, constituem espaços de referência para garantia de refeição diária. Com a pandemia e o isolamento social, a situação ficou difícil.
"Quando as crianças não tiveram mais aula nem acesso aos nossos projetos [do MSMC], porque tivemos que fazer um lockdown geral, nós sentimos muito essa questão da fome. Então decidimos buscar parceiros, conversei com a Profª Eveline, pedi ajuda da UFC, que sempre nos ajudou na produção dos cardápios, com essa assessoria mesmo a distância, on-line, estava aqui presente", conta Natália Martins, diretora executiva do MSMC.
REDE DO BEM – Com parceiros de instituições diversas e pessoas físicas doando insumos e com o apoio da Universidade e voluntários, foi formada o que Natália diz ser uma "rede do bem". "A gente sente que não está só e que não está fazendo qualquer coisa. Nosso cardápio é validado pela Universidade. Não é porque é uma comida dada que é de qualquer forma. Os estudantes [da UFC] chegam visando à segurança alimentar, à higiene, às boas práticas. E todas as mulheres da comunidade que são voluntárias nesse projeto têm, toda semana, a orientação desses alunos que vêm e dizem 'é assim que se guarda esse alimento, é assim que ele vai ficar conservado por mais tempo'. Então eu acredito que o grande sucesso desse projeto também vem pelo apoio desses alunos e da mentoria da professora Eveline", considera.
Ao expressar gratidão à UFC, a diretora declara: "É a Universidade sendo essa ponte para chegar até o mais pobre, o mais abandonado, o mais excluído. E que ele receba na sua mesa uma comida de qualidade, uma comida segura, uma refeição que alimenta não só o corpo mas também alimenta o espírito, alimenta a sua alma, para que ele cuide da sua saúde mental, para que se sinta amparado neste momento tão difícil da pandemia de covid". Ela reforça, assim, o pensamento expresso também pelo presidente do MSMC, padre Rino Bonvini, no portfólio do projeto na EGA, sobre a ação gerar "Nutrição para o corpo e a alma".
EXTENSÃO E PESQUISA – A Profª Eveline Alencar explica que, em razão da pandemia, o programa de extensão Gastronomia Social precisou suspender os cinco cursos que estavam previstos para acontecer, que fazem parte da segunda edição do projeto Gastronomia e Terapia e seriam patrocinados pela Cooperativa de Economia e Crédito Mútuo de Funcionários de Instituições Financeiras Públicas Federais (COOPEFORTE) por meio de edital conseguido pelo Movimento.
Uma forma de manter as atividades, mesmo sem os cursos de capacitação de pessoas da comunidade, foi colaborar com o Movimento na produção de quentinhas. As ações presenciais dos bolsistas na EGA, segundo a coordenadora, se tornaram possíveis depois que autoridades sanitárias e a Reitoria liberaram atividades dessa natureza. Ela cita como normativos o Decreto nº 34.173, de 24 de julho de 2021; Ofício Circular 7/2021/GR/Reitoria e a Portaria nº 151, de 14 de junho de 2021.
A equipe também segue, informa ela, as normas constantes no e-book Protocolo de procedimentos de boas práticas no combate à covid-19 na Escola de Gastronomia Autossustentável publicado por ela e os bolsistas do Gastronomia Social.
Para a Profª Eveline, o diferencial do programa "é que os alunos vivenciam a comunidade na prática. E a produção das quentinhas solidárias também permite que os alunos da Gastronomia discutam, entendam e vivenciem o direito humano à alimentação adequada e as questões de segurança alimentar, que são temas para estudo, transformando esse espaço em um local de extensão e pesquisa".
SOLIDARIEDADE – Os alunos do Curso de Gastronomia da UFC que atuam no programa se dizem transformados com a experiência. Andyara Veras Caetano, do quinto semestre, revela: "O programa me fez ver uma realidade de que eu não tinha noção, eu vi de perto a necessidade da população em vulnerabilidade social, conheci de perto uma das comunidades carentes de Fortaleza, o que me fez ver como temos tantos privilégios e às vezes reclamamos". Ela está desenvolvendo, para seu trabalho de conclusão de curso (TCC), o projeto lixo zero que prevê ações na cozinha da EGA de reciclagem, reaproveitamento e destino adequado dos resíduos sólidos e busca também educar, neste sentido, os colaboradores que participam da produção.
Marcos Daniel Sales Clemente, do sexto semestre, afirma que a participação no programa "tem contribuição direta na sua formação, pois está aplicando os conhecimentos adquiridos na faculdade e praticando [ação] social". Ele considera que "a gastronomia vai muito além da técnica de cozinha, está cada vez mais inserida em vários segmentos. No ensino vem contribuindo cada dia para a capacitação de pessoas que desejam trabalhar ou manipular alimentos". Para ele, que trabalha na área há alguns anos, "[o programa] só veio agregar valores, conhecimentos, técnicas e a capacidade de contribuir de forma social".
Gutenberg de Lima Silva, do sétimo semestre, diz que, para sua formação, tem sido de grande importância atuar no programa. Ao repassar conhecimentos sobre pesquisas e técnicas gastronômicas para as pessoas da comunidade, ele ressalta que "tem oportunidade de exercitar e praticar a docência, despertando o interesse nas pessoas para uma economia solidária e criativa". Gutenberg acha gratificante saber que pessoas que estão desempregadas e excluídas das políticas públicas estão tendo essa assistência e oportunidade de se qualificar e fortalecer, cada um pensando no bem de todos.
Como voluntária da comunidade e ex-aluna dos cursos da EGA, Valdineide Soares Coelho, conhecida como Val, se sente gratificada por saber "que alguém não tinha o que comer em casa e se alimentou devido ao meu trabalho também". Ela diz que na infância vivenciou momentos de dificuldade com a família. Assim, nos dias em que presta o serviço voluntário, Val acorda bem cedo para ajudar, por saber o quanto é importante o que o programa tem feito pelos necessitados. "Espero que continue esse trabalho por muitos e muitos anos, porque eu acredito que as dificuldades das nossas famílias não vão acabar agora, sempre vai ter pessoas realmente precisando e esse trabalho ajuda as pessoas carentes".
Fonte: Profª Eveline Alencar, do Curso de Gastronomia da UFC – e-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.