Expedição inédita, sob coordenação do LABOMAR, detecta peixe-leão, espécie invasora, em águas rasas do NE
- Quinta, 17 Março 2022 16:07
Em uma expedição inédita realizada em parceria com 12 pesquisadores de diversas instituições sob a coordenação do Instituto de Ciências do Mar (LABOMAR), da Universidade Federal do Ceará, e pescadores dos municípios de Camocim e Acaraú, foram capturados, em águas rasas no litoral do Ceará e do Piauí, pela primeira vez, pelo menos nove indivíduos do peixe-leão (lionfish). Trata-se de espécie exótica, invasora e extremamente predadora originária dos oceanos Índico e Pacífico. Essa é quarta captura do peixe-leão no Brasil e, até agora, a que identificou a maior concentração do peixe invasor no litoral brasileiro.
Um dos peixes foi encontrado no município de Camocim e outros sete no mar de Acaraú, Cruz e já no Parque Nacional de Jericoacoara, em Jijoca. As capturas aconteceram durante expedição realizada nos dias 12 e 14 de março, sob a liderança do pesquisador do LABOMAR, Prof. Marcelo Soares, e coordenação de campo do pesquisador Tommaso Giarrizzo, professor visitante do LABOMAR. O trabalho teve ainda a colaboração de uma equipe de pescadores de Camocim e vila de Barrinha, e o apoio do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMbio).
O Prof. Marcelo Soares explica que a espécie peixe-leão é uma grande ameaça por ser predadora de outros peixes e invertebrados marinhos. É também um animal agresssivo e peçonhento, que possui 18 espinhos venenosos, capazes de provocar acidentes. Como o peixe-leão não tem predadores naturais, a espécie se reproduz rapidamente e é considerada uma das espécies invasoras de maior risco global, sendo capaz de causar elevados prejuízos ambientais e socioeconômicos.
“Além disso, por sobreviverem em diferentes habitats e alcançarem grandes profundidades (de 1m a 100m), o manejo das populações invasoras é difícil. Mesmo com programas de capturas intensas em zonas rasas, visto que a espécie pode se reproduzir em águas mais profundas, o controle tem sido um desafio no Caribe e no Mediterrâneo, onde a espécie já é invasora”, acrescenta o pesquisador.
O Prof. Marcelo Soares ressalta que essa captura da espécie no Ceará e Piauí não se trata apenas do primeiro registro de peixe-leão no litoral do Nordeste brasileiro, como a ocorrência mais rasa no Brasil, pois foram encontrados em profundidades que variaram entre um a nove metros. “É muito preocupante que esses registros sejam em ambientes rasos porque pode significar que o peixe-leão já está espalhado por outras regiões do País”, pontuou. O professor comentou ainda que “estes resultados demonstram que o processo de invasão pode ser bastante rápido, afetando a biodiversidade local, a pesca artesanal, o turismo, sendo também um problema de saúde pública”.
ÁREAS DE PROTEÇÃO – Além dos peixes-leão encontrados no Ceará, outros indivíduos da espécie foram registrados no litoral dos municípios de Luís Correia e Cajueiro da Praia, no Piauí. O pesquisador Tommaso Giarrizzo chama atenção para o fato de peixes-leão estarem aparecendo em áreas de unidades de conservação ambiental, como é o caso da Área de Proteção Ambiental do Delta do Parnaíba, no Piauí, e no Parque Nacional de Jericoacoara, no Ceará. Segundo ele, é um agravante porque a ocorrência registrada nessas unidades aumenta o risco ecológico da invasão para a biodiversidade brasileira.
Tommaso Giarrizzo, que coordenou a expedição com o grupo do pescador e mergulhador Alexandre Carvalho, pondera ainda que “as ações de gestão ambiental precisam ser imediatas e urgentes, considerando que a região tropical afetada tem a maioria dos recifes de corais do Atlântico Sul e um alto nível de endemismo, o que aumenta os riscos de ameaça às espécies nativas brasileiras”.
INVASÃO NO BRASIL – Os pesquisadores informam que recentemente (2015-2016) o peixe-leão foi encontrado no Brasil, primeiramente com dois indivíduos capturados no Rio de Janeiro, porém não se confirmou se era uma invasão natural ou soltura de exemplares do mercado ornamental. Mais recentemente, em 2020, foram feitos registros no arquipélago de Fernando de Noronha (um indivíduo capturado vivo via mergulho autônomo) e nos recifes da foz do rio Amazonas (mais dois, pela pesca), entre os estados do Amapá e Pará. Hoje para as duas regiões já foram avistados e capturados mais de 50 indivíduos, confirmando a invasão em águas brasileiras.
A equipe de 12 pesquisadores, disse Marcelo, mesmo sem recursos financeiros específicos para essa ação, está buscando analisar hipóteses sobre a origem da invasão, bem como dados de distribuição e impactos. Os resultados e evidências obtidas serão amplamente divulgados. “Gostaríamos de ressaltar e agradecer o apoio dos pescadores artesanais do litoral do Ceará e do Piauí, que estão nos ajudando a encontrar os locais onde o peixe-leão pode estar. Esse esforço dos pescadores é digno de reconhecimento”, acrescenta.
ORIENTAÇÃO – O Prof. Marcelo Soares orienta para o caso de alguém avistar ou ter informações sobre o peixe-leão no Brasil para repassar os dados através do Sistema Integrado de Manejo de Fauna (SIMAF) do IBAMA ou entrar em contato com o Programa Cientista-Chefe da Secretaria do Meio Ambiente (SEMA) do Ceará (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.). “Se você é um pescador, não devolva o peixe-leão para o mar. Busque os órgãos competentes e informe o acontecido, pois é preciso monitorar essa espécie. Também ressaltamos que o peixe-leão é venenoso, podendo inocular veneno pelas nadadeiras dorsais e, por isso, não deve ser manipulado sem proteção. Indicamos para mais informações o guia elaborado pelo ICMBio", salienta.
Além disso, os pesquisadores chamam a atenção para uma necessidade urgente de ação do Governo Federal via IBAMA e ICMBio no mar brasileiro em parceria com universidades, Marinha do Brasil, ONGs, comunidades costeiras, pescadores, mergulhadores, Governos do Estado e Municípios para o combate imediato a essa espécie, em especial nos municípios relatados e em novos locais para fins de prevenção.
ESTUDO – O detalhamento sobre as informações das capturas e registros do peixe- leão já está em manuscrito pronto e será submetido a revista científica internacional.
Além do LABOMAR, fazem parte desse estudo sobre o peixe-leão as seguintes instituições: Reef Systems Group, Leibniz Center for Tropical Marine Research (ZMT), Bremen, Alemanha; Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio): Parque Nacional de Jericoacoara: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), no Ceará; Projeto Conservação Recifal (PCR), Recife; Laboratório de Ecologia e Conservação de Ambientes Recifais, Departamento de Biologia Marinha, Universidade Federal Fluminense, Niterói, RJ; Universidade Federal do Delta do Parnaíba (UFDPar), Parnaíba, Piauí; Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Campus Penedo, Alagoas; e Núcleo de Ecologia Aquática e Pesca da Amazônia (NEAP), Universidade Federal do Pará (UFPA), Belém, PA.
Fonte: Prof. Marcelo Soares, docente e pesquisador do LABOMAR/UFC – e-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.